Glitch: a arte em muitas camadas - by Danielle Giron
Glitch produzido com a plataforma online Mara (https://mara.photos/color-tint)
Em 2020, durante a pandemia, momentos de claustrofobia me fizeram desejar ardentemente o frescor das águas da Chapada. Procurava e não vinha nenhuma imagem à qual pudesse me conectar.
Não sei pintar coisas criativas da minha cabeça. Talvez por estar ainda presa a um trabalho tão pouco criativo que é escrever "jurisdiquês". Então, busquei uma foto minha a qual pudesse ampliar, era uma boa foto, mas as cores me deixavam: "nhéé...".
Quando ampliei, ficaram uns tons de cinza, uns pixels, nada atraentes.
Então resolvi reunir meus poucos dotes e atributos de desenho. Peguei a tela maior que achei nos sites de vendas da internet: vou fazer a foto na tela. Comprei umas tintas. Acrílicas, a bem da verdade, porque iniciante, né? Desenhei e pintei, por cerca de um mês. Inventei as vitórias-régias, porque nos Marimbus (espécie de "Pantanal" baiano) as plantas flutuantes são diferentes. (será que eu fiz um glitch analógico?)
Foto.
Pintura da foto.
Passei uns dias admirando a pintura em cima do cavalete. Reconheço que me falta a técnica. Mas funcionou. Agora eu tinha minha paisagem de respiro. Meditação.
Vi que a tela no cavalete era uma coisa assim meio poética. Fotografei.
Tanto a foto como a pintura da foto como a foto da pintura da foto passaram uns tempos esquecidas. A pintura mudou de lugar e a foto foi encoberta por diversas outras que a sucederam.
Então veio a aula sobre "glitch". Estou fazendo o BI de Artes da UFBA. Peguei o componente meio sem saber o que era, mas atraída por aprender técnicas novas. Há algum tempo vinha aprendendo a desenhar com o tablet, produzi umas coisas com um resultado bem bacana. E adorei o glitch.
Glitch, traduzindo, erro. Mas na verdade alguém descobriu que esses erros resultavam em coisas visualmente atraentes. E o "erro" passou a ser propositalmente produzido.
Claro que os resultados passam pelo olho clínico do artista. Tem toda uma disposição e um contexto em que essas produções são exibidas. Então não basta produzir o erro e chamá-lo de arte. Mas, sim, o resultado pode se tornar arte.
A foto que ilustra esse post é resultado de um glitch que fiz sobre aquela foto da pintura da foto. Achei interessante que a parte superior, que eu pintei, quase não foi mexida. A parte das vitórias-régias inventadas - a mais cheia de contrastes da pintura - ficou com cores e tonalidades muito esmaecidas, quase não dá para ver o que é. E a parte inferior da foto, que refletiria a verdade real, com as coisas da maneira que estavam, pés do cavalete, tubo de tinta, bagunça da estante atrás etc, tudo isso ficou pontilhado, com ares de irrealidade, sonho, abstração.
Achei que ficou mais poético ainda. Essa coisa de realidade misturada com indefinição. A "estética do erro", como diz a professora Karla Brunet.
Devo avisar que a técnica mais correta, para quem conseguiu - eu ainda não - é acessar a imagem, ou som - sim, sons também podem ser objeto de glitch - em sua versão original em tiff/raw ou outro formato - e mexer no código de programação, aleatoriamente, escrever um linha, inserir uma palavra, apagar uma parte, com o cuidado de não mexer nas primeiras linhas da programação da foto ou video, ou ou som (que são o que realmente definem as mídias utilizadas).
Na vida, a gente descobre que o erro não é tão é tão ruim assim.
Na sequência da esquerda para a direita e de cima para baixo: 1. minha foto, 2. minha pintura, 3.inspiração (em outra foto que não sei de quem é), 4. foto original "da pintura da foto" usada para o Glitch.
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